Minha homenagem ao centenário de Rubião
Primeiro de junho
foi o centenário do Murilo Rubião. Nada mais justo que prestar uma homenagem ao
mestre. Vou tentar fugir do óbvio, evitar falar de sua proximidade com Kafka
e da importância de seu texto para o realismo mágico nacional. Vou
para outro lado de Rubião que chamou minha atenção logo de cara: o humor. Nesse
aspecto, vejo-o próximo a Machado por conta da ironia e da acidez ao retratar as relações pessoais. Não à toa, vamos encontrar na epígrafe de “Memórias do contabilista
Pedro Inácio” uma referência direta a Brás Cubas: "Marcela amou-me por
quinze meses e onze contos de réis". Rubião parte do capítulo XVII de
Memórias Póstumas para traçar um perfil da vida amorosa de seu personagem Pedro
Inácio.
“1 — Ah! O amor.
O amor de Jandira me custou sessenta
mil-réis de bonde, quarenta de correspondência, setenta de aspirina e dois anos
de completo alheamento do mundo. Fora cinquenta por cento de meus cabelos e as
despesas com os clínicos que, erroneamente, concluíram ser hereditária minha calvície.”
Pedro Inácio é um personagem
obcecado por encontrar o motivo de sua calvície, de sua mania
pela contabilidade e de seus fracassos amorosos. O final do conto é
espetacular.
Outro personagem icônico
da literatura de Rubião é o protagonista de “O bom amigo Batista”. Não é
incomum em nossa sociedade a exaltação da solidez e da fidelidade na amizade entre
dois homens. Rubião brinca com esse ideário e produz um texto divertidíssimo: o
protagonista passa o conto tentando justificar os atos mais vis de seu
melhor amigo.
“Desde a infância procuraram meter-me na
cabeça que devia evitar a companhia de João Batista, o melhor amigo que já
tive. A começar pelo meu irmão:
— Não vê, José, que Batista está abusando
de você? Todos os dias come da sua merenda, copia seus exercícios escolares e
ainda banca o valente com os outros meninos, fiado nos seus braços. Todavia,
quando os moleques lhe deram aquela surra, nem se abalou para ajudá-lo.
Era uma injustiça. Batista não viera em
meu auxílio, como explicou em seguida, porque fora acometido de cãibra
justamente no momento em que fui agredido.”
Outros exemplos do humor de Rubião
estão no conto “D. José não era”, que gira em torno da identidade e das intenções do protagonista. D. José é acusado de muitas coisas, desde
explodir a mulher a dinamite até a falar com duendes. No encerramento do conto,
a elucidação do mistério.
“5 — Um dia
encontraram-no enforcado. Disseram imediatamente:
— É só fingimento.
O nó está pouco apertado.
— Vejam que cara
matreira. Está zombando de nós.”
O mesmo tipo de humor perspicaz
é encontrado em contos mais famosos como “O ex-mágico da Taberna Minhota” e “Bárbara”.
Como não rir de frases como “Ouvira de um homem triste que ser funcionário
público era suicidar-se aos poucos” e “Bárbara gostava somente de pedir. Pedia
e engordava”. Há
quem ache os textos de Rubião um tanto sorumbáticos, mas pra mim ele foi um artista de humor.
Comentários
Postar um comentário